“25 de Abril sempre,” ou só às vezes? Este ano, celebramos, e lutamos pela realização das promessas do 25 de Abril, desde a distância. O tempo pede que assim seja, mas afinal o que diz esta data para nós, populares e estudantes? A narrativa mais apresentada é a de uma revolução sem sangue que não podia estar mais distante da realidade. Higienizar a sua imagem, a um punhado de capitães de Abril que um dia decidiram depôr um regime é branquear a história de estudantes que lutaram e morreram, da crise académica de 69, dos guerreiros e guerreiras que lutaram pela libertação das colónias e dos desertores portugueses que ousaram não levantar armas contra seus irmãos. Todas e todos eles forçaram o regime a seus limites até o exército português, nestas condições, se rebelar. Também foi o povo que tomou as ruas e desmantelou uma parte considerável do aparelho repressivo do Estado e da PIDE-DGS, contando com 4 baixas a 25 de Abril mas muitos sucessos no dia e meses seguintes à revolução, mas também já de trás, com o peso de muito sofrimento e vidas perdidas nos calabouços do regime. Que vozes silenciamos quando a narrativa oficial defende que as lutas de libertação terminam com um golpe militar em Lisboa? E a história de resistência das colónias já depois do dia 25? Alguém se esqueceu quão difícil foi o processo de independência das colónias antes e depois dessa data? E como muitos eram aqueles que preferiam um retorno ao fascismo em Portugal e conspiraram campanhas de terror, golpes e atentados com esse propósito? É por estas e por outras questões que nos recusamos a manter submissos ao mito da narrativa hegemônica, de que a revolução dos cravos se fez sem mortes. Agora, em tempos de confinamento, nós, do povo, enfrentamos o desafio de celebrar o 25 de Abril afastados. Num tempo onde os saudosistas do regime ditatorial, ressentidos com os privilégios que perderam, encontraram na pandemia uma justificação para deixar de lado uma das datas mais importantes para o povo - o que teve um maior eco na petição em favor de fechar o parlamento, exclusivamente no dia 25, apesar de este se encontrar aberto desde o início da pandemia do Covid-19 e haverem condições de segurança identicas. Não nos enganam, continuamos a exigir um esforço mínimo – que clamemos nós de nossas varandas, e que aqueles que dizem representar o país marquem presença para manter viva a memória da importância das conquistas de direitos e liberdades de Abril, conquistas do povo e não meras atribuições dos de cima. Clamemos para saberem que ainda não chegou e que há muito, muito mais trabalho pela frente. Devemos deixar claro aos saudosistas e exploradores dos dias de hoje que o 25 de Abril foi apenas um compromisso, uma revolução deixada a meio. Como cantado por Fausto, “há quem fale já em liberdade, a de dizer ou a de irmos e virmos. É bem diferente de uma outra que queremos, que é ter nas mãos aquilo que produzimos.” Abril fez-se para que não sejamos explorados e exploradas. E não chegou. A nossa luta e a nossa solidariedade são internacionais e sabemos que os direitos de todos e todas as trabalhadoras estão longe de estar garantido, em Portugal e no Mundo. Abril para quem? Abril fez-se para terminar a guerra colonial e a discriminação racial. E não chegou. Portugal continua a ter níveis absurdos de racismo que se manifestam em episódios de violência policial contra corpos racializados, à forma como as comunidades migrantes, ciganas... são tratadas. Abril para quem? Abril fez-se para libertar a mulher da sociedade machista. E não chegou. Não celebramos enquanto os agressores seguem impunes, enquanto violadores sexuais virem suas penas serem atenuadas injustificavelmente, enquanto as taxas de violência doméstica continuarem a ser uma preocupação em Portugal e no mundo. Abril para quem? Abril fez-se para a revolução sexual, para as bichas, para as lésbicas, para as queers. E não chegou. Não enquanto precisarmos de casas-abrigo por adolescentes terem sido expulsos e expulsas de casa pelas suas famílias conservadoras. Não enquanto todas as instituições da sociedade perpetuarem estruturalmente discriminação de pessoas com base nas suas orientações sexuais, relacionais e suas identidades. Abril fez-se para o povo ter nas mãos o seu futuro. Abril foi mais um passo no nosso trilho até à liberdade. Abril não chegou a todos e todas. Desde 1974, muitas conquistas foram-nos roubadas e traídas - promessas daqueles sonhos que tiraram o sono aos exploradores e deram uma nova vida aos e às exploradas. Mas ainda não é tarde! Festejemos o que ganhamos, mas lutemos com o dobro da força pelo que ainda está por vir! Celebremos esta data junto daqueles que continuam a lutar diariamente por uma vida digna e livre do machismo, do racismo, da pobreza, da opressão. Saudamos o trabalho de vários coletivos deste país que trabalham juntos diariamente para levar os valores de Abril mais longe. Saudamos o trabalho das colectividades feministas, antirracistas, comunitárias e sindicais autônomas de Norte a Sul e nas ilhas, e de tantos e tantas trabalhadoras que, independente de sua filiação, dão o corpo à luta. Abril não está limitado às fronteiras do país. A luta pela liberdade, pela democracia, e pelo fim da exploração das e dos trabalhadores, está viva por este mundo fora, desde os territórios livres: em Rojava na Síria, a Chiapas no México, como dos povos originários Mapuche, no Chile e Argentina, aos Guarani-Kaiowa no Brasil e Paraguai, que são apenas alguns que fazemos menção pela sua situação na frente de batalha, mas que partem de uma mesma luta que nasce no coração de todos os povos resistentes. Portugal não é dono da liberdade e é neste dia que devemos pensar não só nas liberdades que atingimos, mas também nas regiões que são frente activa dessas conquistas e por consequência, mais fortemente reprimidas pela ordem internacional, e que podem beneficiar de nossa solidariedade. Lutemos para que das nossas casas saia um movimento forte, organizado, combativo, que reorganize a sociedade de modo a elevarmos os potenciais solidários das comunidades. Lutemos não por um 25 de Abril que já passou, mas por uma luta internacional que agora continua! 1. "Contra-memórias do 25 de Abril": 2. "Testemunho: Aurora Rodrigues"
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COLETIVOS JUNTAM-SE E LANÇAM CAMPANHA RELATIVA À COVID-19:
As semanas passam, a crise económica aprofunda e o peso do Ensino Superior na carteira de estudantes e das famílias trabalhadoras continua a fazer-se sentir. Além das próprias desigualdades sociais que o ensino à distância acentua, onde possibilidades diferentes de acesso à internet e aos materiais continuam sem resposta universal por parte do governo e das instituições de ensino; onde a própria qualidade, conforto e segurança dentro de casa são um fator muitas vezes esquecido; onde estudantes-trabalhadores têm um aumento de instabilidade económica e mental, seja porque estão a trabalhar sem condições seja porque podem ser ou são demitidos; a própria qualidade geral do Ensino Superior sofreu consequências, independentemente da boa vontade e esforço de todas e todos os professores e estudantes, e ao contrário do que reitores, ministros e demais burocratas nos querem fazer crer. Por todas estas razões exigimos a Isenção da Propina Já! Agora, mais do que nunca, é necessária a isenção do pagamento da propina do segundo semestre, com o direito de devolução do dinheiro de quem já pagou parte do segundo semestre, tal como a isenção das tantas taxas e emolumentos cobrados pelas universidades portuguesas, incluindo as inscrições nos exames e melhorias de nota, e ainda a isenção do pagamento das residências universitárias e das rendas quando a Universidade é senhorio. Não pagamos mais crises e não aceitamos a precarização acelerada da Educação Pública em Portugal, com ou sem pandemias! Incentivamos todos os coletivos e movimentos sociais que apoiam estas pautas a juntar-se à lista de subscritores, a partilhar este apelo e a lutar connosco pela Isenção da Propina Já! Assinam: RELL (CEL_Lisboa, RELL-Porto, RELL-Coimbra) Rede de Apoio Mútuo LX (Lisboa) Disgraça (Lisboa) República Ninho da Matulónia (Coimbra) Real República da Prá Kys Tão (Coimbra) Stop Despejos (Lisboa) Habita (Lisboa) Assembleia de Solidariedade Estudantil de Lisboa (Lisboa) COLETIVOS JUNTAM-SE E LANÇAM CAMPANHA RELATIVA AO COVID-19:
Falemos de algumas precauções a serem tomadas nas medidas de combate ao coronavírus. Comecemos por declarar que não podemos permitir que, com a justificativa de supressão do vírus, sejam suprimidas as nossas liberdades individuais e coletivas. A declaração do Estado de Emergência em vários países tem significado multas, detenções, retração dos direitos laborais, abusos políciais e até penas de prisão. Por cá a população, de uma forma geral, tem demonstrado ser consciente da importância do isolamento social sempre que é possível,de ser capaz de pensar e pôr em prática diversas ações solidárias e de estar disposta a aprender sobre os cuidados sanitários necessários, muitas até antes da declaração de todas estas medidas restritivas. Projetos populares como cantinas solidárias, pontos de recolha e partilha de alimentos e roupa, distribuição de máscaras e tantas outras iniciativas individuais de apoio às pessoas que configuraram grupos de risco ou em sufoco económico, espalham-se por todo o território nacional, o que evidência a existência do potencial reativo e organizativo das comunidades. Então porque é que a abordagem dos estados para resolver um problema de saúde global passa por imposição de medidas repressivas e paternalistas? Porque é que parte da população aceita e encontra nestas normas a ilusória ideia que estas funcionarão como uma espécie de vacina anti-viral? E porque é que o foco real não está nem nunca esteve no reforço e proteção do sistema sanitário e de todos os individuos? É certo que todas estas estratégias estatais já seriam espectáveis mas não podemos deixar de afirmar que o que deve ser fortalecido são os modos e as condições para ampliar a capacidade de responsabilidade individual e coletiva, e não aceitamos que a forma imposta pelo Estado de combater a pandemia esteja centrada no castigo, na precarização do trabalho e desproteção dos mais vulneráveis. Lembramos, também, que na administração de políticas públicas, não se pode não analisar quem serão os agentes que as executarão. No caso de políticas repressivas, esta tarefa recai nos braços das forças políciais, como a PSP, que tem sido alvo de diversas acusações de racismo. Esta mesma PSP figurou nas notícias recentes com flagrantes espancamentos de pessoas negras e imigrantes, prática que infelizmente constata-se recorrente dentro da instituição. Ao delegar esta nova amplitude de poder a estes corpos de controle, em nome da saúde pública, é tornar mais vulnerável justamente a população não branca e a população imigrante que fica à mercê da arbitrariedade dos seus agentes. Outra das principais imposições do estado de emergência é a suspensão do direito à greve, onde facilmente detetam-se várias contradições que por si só demonstram que em nada estas medidas pretendem ser eficazes no combate à pandemia. Deixar os direitos laborais totalmente à mercê dos patrões, é comprometer o livre acesso à quarentena e à escolha do isolamento social. A saúde pública não pode ser tratada como um caso policial, nem como justificativa discursiva para a repressão Reclamamos a total possibilidade de organização e que as prioridades passem por garantir o acesso indiscriminado a formas de protecção e apoio seja no âmbito sanitário, habitacional, laboral e social. Contra o estado de emergência! Contra a policialização da saúde pública! Queremos condições materiais para o distanciamento social, e não repressão e violência! Assinam: RELL (Lisboa, Porto e Coimbra) Rede de Apoio Mútuo LX (Lisboa) Disgraça (Lisboa) Stop Despejos (Lisboa) Habita (Lisboa) República Ninho da Matulónia (Coimbra) Prá Kys Tão (Coimbra) |
RELLA Resistência Estudantil Luta e Liberdade é uma organização de tendência estudantil de caráter popular, classista, combativo, horizontal e autônomo, pela construção de um movimento estudantil autogestionário que responda às necessidades de luta e resistência contra os ataques os quais as e os estudantes têm sido alvo. Histórico
Janeiro 2021
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